segunda-feira, 1 de agosto de 2011

Pecado e Genética

Existe algum gene que poderia ser responsabilizado pelo comportamento pecaminoso do ser humano? Por que todo descendente de Adão e Eva, exceto Jesus Cristo, comete pecado? Escrevendo aos romanos, disse o apóstolo Paulo: “Pois todos pecaram e carecem da glória de Deus” (Rm 3:23). Esse assunto é reiterado no capítulo cinco da mesma carta: “Portanto, assim como por um só homem entrou o pecado no mundo, e pelo pecado, a morte, assim também a morte passou a todos os homens, porque todos pecaram” (Rm 5:12). Sobre essa passagem, o Comentário Bíblico Adventista del Séptimo Dia declara: “Quando Adão e Eva se rebelaram contra Deus, eles não apenas perderam o direito à árvore da vida, o que inevitavelmente resultou na morte deles e na transmissão da morte a seus descendentes, mas, por causa de seu pecado, também se tornaram depravados em sua natureza, reduzindo assim a força para resistir ao mal... Assim, Adão e Eva transmitiram à sua posteridade uma tendência para pecar bem como a sujeição ao correspondente castigo, a morte.”¹ Se assim for, teríamos nós um fator hereditário que nos colocaria em desacordo com o Senhor? Poderia esse fator ser um “gene do pecado”?

Genes Os genes determinam nossa constituição física, traços básicos de personalidade e atitudes. Eles exercem grande influência sobre quem somos e como nos comportamos. Os genes são segmentos de cromossomos que dirigem a produção de proteínas. A partir de 2003, sabemos que a estrutura química de nossos genes se espalham por 24 cromossomos.² O material genético humano, encontrado em cada célula (exceto os glóbulos vermelhos), consiste de 3.164 bilhões de unidades chamadas nucleotídeos. Toda informação requerida para formação de um ser humano se encontra na ordem em que os quatro diferentes nucleotídeos estão acoplados. Um único gene contém milhares de nucleotídeos e seus códigos para um ou mais tipos de proteína. Cada um de nós tem aproximadamente trinta mil genes, mas só conhecemos as funções de aproximadamente metade deles. Entretanto, os genes ocupam apenas 2% de nossos cromossomos; os 98% restantes são material “não-gene” cujas funções ainda não são bem compreendidas. Contudo, ninguém sabe como saímos das proteínas para o comportamento e personalidade; em parte, devido à nossa incompleta compreensão da função cerebral. Toda atividade cerebral depende dos movimentos nervosos entre milhões de células cerebrais. Na juntura entre as células nervosas existem lacunas chamadas sinapses. Os impulsos nervosos não podem passar de uma célula a outra, sem os neurotransmissores. Suspeitamos que os níveis desses neurotransmissores (produzidos pelas proteínas) provavelmente determinem como são gerados os pensamentos e sentimentos. A influência dos genes é claramente vista em crianças, quando elas mostram aptidão para arte, música, matemática e outras áreas – tudo herança de nossos ancestrais. Porém, se nessa herança existe a tendência para pecar, a grande pergunta é: Qual dos trinta mil genes é responsável por isso?

Na queda Depois dos seis dias da criação, “viu Deus tudo quanto fizera, e eis que era muito bom” (Gn 1:31). O Criador fez uma exaustiva revisão de todos os aspectos da criação, segundo as perspectivas da engenharia, biofísica, bioquímica, psicologia, ecologia, relacional e sociologia. Portanto, devemos aceitar que nada havia de errado com Adão e Eva, quando eles saíram das mãos do Criador. O primeiro casal não poderia ter sido criado com tendência a pecar. Assim sendo, vamos dar uma olhada na história do primeiro pecado real, em busca de vestígios que nos ajudem a entender como foi adquirida a tendência para pecar. No relato do Gênesis sobre a queda do ser humano em pecado, a única consequência foi que “abriram-se, então, os olhos” de Adão e Eva, e eles foram despertados para o fato de que estavam nus. Na ausência de informação adicional, “abriram-se, então, os olhos” é uma frase difícil de compreender, mas isso, de modo nenhum poderia implicar uma súbita depreciação da estatura moral de Adão e Eva. O que aconteceu a eles, depois do pecado? Acaso, teria o Senhor modificado os genes de ambos, de modo que a partir de então a natureza do casal se tornasse pecaminosa? Embora isso tenha sido possível, é muito mais seguro permanecermos confinados aos limites da narrativa bíblica. Ao lado disso, seríamos nós capazes de crer que o Criador de toda coisa boa e maravilhosa Se rebaixaria para corromper Sua própria criação? Seja o que for que tenha acontecido no Éden, e depois, na queda, a noção de que nós temos a compulsão para o pecado inserida em nossa própria estrutura é, na verdade, preocupante. A expressão dos genes é automática (como a cor do cabelo ou o formato do nariz de alguém); não temos escolha nesse assunto. Assim, caso tenhamos um “gene do pecado”, o comportamento pecaminoso poderia ser considerado produto natural e irresistível da natureza humana. Para agravar ainda mais o assunto, alguns textos bíblicos parecem dar a impressão de encorajar o argumento de que o pecado tem uma base genética. Um deles é o seguinte: “Pode, acaso, o etíope mudar a sua pele ou o leopardo, as suas manchas? Então, poderíeis fazer o bem, estando acostumados a fazer o mal” (Jr 13:23). Felizmente, esse texto pode ser compreendido como afirmando que o comportamento pecaminoso tem se tornado tão natural, como as características geneticamente determinadas, que pecamos tão facilmente. Isso faz mais sentido do que ver nesse texto alguma evidência para um suposto gene do pecado.

Gene duvidoso Na verdade, os argumentos contra a noção de um gene do pecado são mais impressivos que os argumentos favoráveis. Se o pecado tivesse uma base genética, o Criador poderia ser responsabilizado pela nossa natureza pecaminosa. O julgamento do comportamento pecaminoso se constituiria uma simulação de justiça. Mesmo nas cortes celestiais, o comportamento divergente baseado em causas fisiológicas é tratado de maneira compassiva. Adicionalmente, não haveria maneira conhecida para fazer alguém deixar de pecar, e a conversão somente seria possível com uma mudança genética. Ordinariamente, caminhamos através da vida com nossos genes herdados; o comportamento não altera os genes. A exceção a essa regra é a exposição à radiação ou a substâncias mutagênicas. Alguém pode argumentar que o Senhor poderia, sobrenaturalmente, alterar o gene do pecado. Mas, depois de tal mudança, o indivíduo convertido seria incapaz de pecar novamente, a menos que pudesse haver outra mudança genética, desta feita, na direção errada. E mais: se fosse possível identificar um gene do pecado, o problema poderia ser resolvido por meio de alguma terapia genética, assim como acontece com qualquer outra doença causada por genes defeituosos. Não haveria razão para pensar que a graça salvadora de Deus fosse necessária para a transformação do caráter. Então, como nós poderíamos explicar a natureza sem pecado de Jesus? A não ser que Ele tivesse nascido sem o suposto gene do pecado, ou este fosse de algum tipo mutante, uma variedade impossível de pecar. Nenhuma dessas opções parece satisfatória, especialmente considerando que o Salvador também deve ser visto como nosso exemplo. Se o pecado não é passado de uma geração à outra através de genes, outra única possibilidade poderia ser as influências ambientais. Mas, a ideia de que o pecado resulta de influências externas abre o caminho para que seja desculpado. Ao lado disso, podemos encontrar muitos exemplos mostrando que o pecado pode ocorrer em um ambiente perfeito, como o Jardim do Éden, ou não necessita ocorrer em um ambiente pecaminoso. Jesus cresceu em Nazaré e não Se deixou contaminar pelas influências que O cercavam. Pecado só é pecado quando é originado da livre escolha do ser humano. Se o comportamento pecaminoso de alguém for resultado de forças externas ou internas, ele pode ser desculpável. Por exemplo, existe uma condição geneticamente determinada, chamada de “síndrome de Tourette”. Indivíduos com essa doença têm uma forma profana de falar. Também há casos documentados em que lesões na cabeça têm resultado em profundas alterações na personalidade de uma pessoa. Nesse caso, pessoas anteriormente responsáveis se tornam fantasiosas e irresponsáveis.

Autopreservação A amplamente espalhada natureza do pecado certamente sugere a presença do elemento genético, entretanto irrazoável, ou de um gene do pecado. Mas, que dizer se o comportamento pecaminoso for causado não apenas por um fator, mas por uma combinação de fatores, inclusive alguns de natureza genética? Além disso, os componentes genéticos não poderiam compelir ao comportamento pecaminoso, mas simplesmente nos predispor a ele, deixando conosco a liberdade para decidir pecar ou não pecar. Vamos considerar o gene pecaminoso chamado egoísmo, que é a promoção do interesse pessoal acima das necessidades de outras pessoas. Na realidade, esse pecado pode ser descrito como uma distorcida expressão de autopreservação, tendo nosso instinto para o pecado do egoísmo como o fator genético. Durante muitos anos, estudei as mudanças bioquímicas na bactéria Escherichia coli, depois da exposição dela ao agente redutor chamado tioglicerol. Notei que essa substância inibe ou retarda o crescimento dessa bactéria, e decidi pesquisar como isso acontece.³ Foi verificado que a célula bacteriana toma medidas extremas para se libertar da substância ofensiva (G. T. Javor, Antimicrobial Agents and Chemotherapy 23 (1983), p. 860-867). Agora sabemos que, mesmo nessa simples bactéria, existe transmissão de genes designados a defender a célula contra os efeitos adversos de súbita eclosão de calor, frio, pressões externas, e muitas outras mudanças ambientais (E. C. C. Lin e A. S. Lynch, Regulation of Gene Expression in Escherichia coli (Georgetown, TX, e Nova York, NY: R. G. Landers and Chapman & Hall, 1996). Em outras palavras, a vontade de viver foi construída, pelo Criador, na própria fibra de todo organismo. Adão e Eva, também, foram criados com esse instinto de autopreservação. Enquanto estavam sem pecado, eles se sentiam seguros nos limites afetuosos do Éden. Porém, depois do pecado, quando se encontraram estupefatos diante de uma súbita incerteza quanto ao futuro e eventual morte, seu instinto de sobrevivência emergiu. Esconderamse do Senhor e tentaram lançar para longe de si mesmos o fardo da culpa. Nós também tratamos diariamente com nossos instintos de sobrevivência. Em toda situação em que nos encontremos, essa necessidade nos impele a escolher um curso mais vantajoso para nós mesmos. Porém, aqui nós temos uma verdadeira escolha: não somos compelidos a beneficiar a nós mesmos durante todo o tempo. Nesse nível, os seguidores do Mestre são solicitados a praticar autonegação em favor de outros.

Acima dos instintos De fato, Paulo diz que o cristão é chamado a morrer diariamente para o eu (1Co 15:31); mas, ele mesmo confessou: “Então, ao querer fazer o bem, encontro a lei de que o mal reside em mim. Porque, no tocante ao homem interior, tenho prazer na lei de Deus; mas vejo, nos meus membros, outra lei que, guerreando contra a lei da minha mente, me faz prisioneiro da lei do pecado que está nos meus membros” (Rm 7:21-23). A lei a que Paulo se refere aqui bem pode ser nosso egoísmo enraizado, mas sem gene do pecado. Embora sejamos geneticamente programados para lutar pela sobrevivência e buscar conforto, podemos controlar a extensão na qual responderemos aos nossos impulsos internos. Não somos fantoches nas mãos dos nossos genes. Enquanto estivermos na Terra, enfrentando incertezas, envelhecimento e morte, teremos que lidar com o egoísmo, um pecado tão difundido quanto a gravidade. Mas, assim como as águias têm asas para enfrentar a gravidade (Is 40:31), o filho de Deus tem acesso ao Espírito Santo a fim de superar o egoísmo (Rm 8:9-11). Somente na Nova Terra, quando as perspectivas de doenças e morte serão removidas, estaremos libertados das sombrias consequências de nosso instinto de sobrevivência.

Referências:
1 Comentário Bíblico Adventista del Séptimo Dia,
v. 6, p. 531.
2 J. D. McPherson, Nature 209, p. 934-941; J. C.
Venter, Science 291, p. 1304-1351.
3 K. Jensen e G. T. Javor, Antimicrobial Agents
and Chemotherapy 19 (1981), p. 556-561.

Fonte: Prof. G. T. Javor, Revista Ministério Nov. e Dez. de 2010.

2 comentários:

  1. Amei sua explicação e o título do tema. Até salvei a pagina para dar a uma amiga professora de matematica que assim como eu estamos estudando a fundo essa idéia tão difundida entre o povo ASD-MR, não sei como anda na igreja adventista, mas na reforma até o presidente da conferencia geral crê que pecamos porque nós é inerente a natureza e ainda o obreiro da nossa igreja teve a coragem de dizer que herdamos a culpa de Adão.E se me permitir quero publicar esse artigo no meu blog com os devidos creditos.
    Muito obrigada pelo estudo foi muito esclarecedor.

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  2. Olá Silvana. Fico feliz por uma das postagens ter sido útil intelectual e espiritualmente para você! Fique à vontade e o que precisar sobre Bíblia e Ciência vamos orar e estudar juntos. Deus a abençoe e aos irmãos da Reforma. Um abraço.

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